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Projeto Colo de Vó promove acolhimento, pertencimento e renda para mulheres 60+ em Teresópolis/RJ

Matéria publicada em 22 de novembro de 2024

A situação do idoso na época da pandemia e pós-pandemia de Covid-19 foi o que motivou o início do projeto Colo de Vó, que promove acolhimento, trocas e renda através da atividade do crochê, e é coordenado por uma das gestoras do Colo da Montanha, Sayuri Kimura. Durante esse período, o cuidado com sua família, e em especial com sua mãe, foi muito intenso. Mas, com o fim do isolamento social e com a volta às atividades profissionais e sociais, veio também a volta à rotina de sua mãe, que, como tantas outras idosas, careciam de cuidados, convivência social, afeto e sentimento de pertencimento e utilidade. Veio então a ideia de aproveitar um hobby antigo, o crochê, e criar um espaço de acolhimento para mulheres com mais de 60 anos que pudessem se encontrar, trocar e crochetar. Durante décadas a Sra. Tereza Kimura, mãe de Sayuri, doava enxovais para recém-nascidos em situação de vulnerabilidade social, mas após o período de isolamento social foi a primeira vez que ela havia perdido o interesse nessas doações. Foi então que Sayuri entendeu que o momento era delicado e que ela poderia fazer algum movimento que gerasse prazer, acolhimento e sentido para a vida de sua mãe, e criou o Colo de Vó.

Dona Néia (esq) e Dona Tereza Kimura (dir)
Bruna Brasil (Yôga para gestantes), Sayuri Kimura (Colo da Montanha e Colo de Vó) e Ana Litardo (Associação Agroecológica de Teresópolis)

“Quando as crianças voltaram ao presencial e minha filha, Lara, voltou para o Colo da Montanha, ela estava maravilhosa, mas minha mãe estava muito triste e deprimida. Fiquei pensando que ela precisava de um Colo da Montanha, um espaço preparado, com pessoas preparadas para ela seguir com o que queria fazer. Nós sempre tivemos essa questão da manualidade em nossa família”, conta Sayuri. Assim foi plantada a semente do Colo de Vó, com a sublocação de um quarto na nova sede do Colo da Montanha, que foi transformado em atelier de crochê de mulheres 60+. Quando a notícia começou a se espalhar na cidade, chegaram cinco idosas à escola, todas elas estavam interessadas na oportunidade de geração de renda para a manutenção de suas famílias. Essas pessoas passaram suas vidas trabalhando em serviços domésticos e outros, não tinham aposentadoria, estavam cansadas e com questões de saúde próprias da idade, mas enxergaram uma possibilidade de adquirir um novo conhecimento e poder trabalhar em casa.

Acolhimento, inclusão e renda

Sayuri conta que essas cinco mulheres que chegaram à escola, sem se conhecer anteriormente, faziam parte de um outro recorte social que ela já havia identificado no CRAS – Centro de Referência de Assistência Social – de Teresópolis. Elas não tinham mais disposição para trabalhos braçais e pesados, mas queriam continuar trabalhando em casa pois ainda não tinham idade para se aposentar. Apesar da vontade de participar da ação, elas não sabiam fazer corchê. Nesse período, o Colo da Montanha estava passando pelo processo de formalização escolar pela Secretaria de Educação e precisou da sala ocupada pela atividade do crochê.

CRAS Barroso
CRAS Alto

Mas nessa mesma época, em 2023, Sayuri conheceu a secretária de Desenvolvimento Social, que já estava sabendo do projeto, e a conexão aconteceu. Muitas senhoras no CRAS precisavam de atividades e o projeto precisava de um novo espaço. Assim, em 2023 a secretaria cedeu um galpão do CRAS de Barroso para ser sede do projeto Colo de Vó e, em 2024, o Colo de Vó foi convidado para expandir a roda de crochê das idosas para o CRAS Alto. O novo local oferecido, o CRAS Alto, estava em região mais central da cidade e abrigavam uma comunidade de mais de cinquenta mulheres ávidas por atividades. Hoje, o projeto tem trinta idosas cadastradas e mais de vinte frequentando, e alguns passeios foram sendo planejados, como um até a escola.

Entrega dos enxovais no CRAS Alto

Ressignificando suas vidas

Para Sayuri, o principal ponto deste projeto está nas conversas que vão sendo tecidas enquanto se tecem os fios de crochê. Nelas surgem muitas questões para reflexão, como o espaço das mulheres na sociedade; contam sobre suas vidas; suas casas vazias pois seus filhos cresceram e se mudaram; as que envelheceram e não tiveram filhos. No mês do meio ambiente, foi montada uma roda para crochetar ao ar livre na praça do Colo da Montanha. Lá, as idosas tiveram contato com crianças bem pequenas e se encantaram de vivenciar um outro tipo de escola, com crianças livres, descalças, de short ou fralda e tomando banho de mangueira.

O Colo de Vó na praça da Escola Colo da Montanha

O projeto social Colo de Vó, que começou bem pequeno com mãe e filha buscando conexões e sentidos, se transformou em algo relevante para a escola e a cidade. Através dele, a relação com a Secretaria de Desenvolvimento Social se estreitou e o Colo da Montanha passou a ser mais conhecido em outras áreas da cidade. “Teresópolis é um município muito conservador e o Colo da Montanha é uma das poucas escolas alternativas e regenerativas da cidade. Para começar esse diálogo nós precisávamos dar um passo para fora da comunidade de fato, em direção às pessoas que não fazem parte da nossa bolha. O Colo de Vó começou a afetar outras pessoas, para doações de fios, e que começaram a conhecer o Colo da Montanha”, explica Sayuri.

Ana Litardo, da AAT – Associação Agroecológica de Teresópolis, nas atividades semanais no Colo da Montanha

A possibilidade de remuneração dos apoiadores do Colo de Vó através da moeda social Muda, que fez parte do fomento da Saúva em 2024 para o Colo da Montanha, contribuiu para a chegada de novos profissionais interessados em apoiar as infinitas demandas da comunidades de mulheres 60+. As ideias referentes ao uso das Mudas foram amadurecidas com as visitas do Leandro Almeida e Izabel Stewart à escola, além das falas da Helena Stewart durante o encontro No Coreto. Todas elas apontando para as possibilidades de criação de novas ações para estimular a entrada na plataforma e consequente uso de Mudas.

“Estávamos com uma ideia das trocas (por cestas orgânicas) na Feira Orgânica, que as fornece para o Rio de Janeiro. Mas pensamos que talvez haja outro lugar para identificar a importância do que está sendo oferecido ali. (…) Esse grupo é muito diverso e ali tem a vulnerabilidade real, que eu achava que conhecia mas não conhecia. Estudando a plataforma da Muda eu pensei em fazermos sabonetes ou óleos essenciais, mas eu quero passar essas Mudas para elas com o projeto de 2024, que foi montar colchas de crochê com os quadradinhos da vovó”.

Sayuri Kimura – Colo da Montanha e Colo de Vó
Participantes do Colo de Vó no espetáculo “Solo da Cana”
Entrega das mantas produzidas em 2024 no CRAS

Até hoje foram produzidas 15 colchas que as participantes decidiram doar para outras idosas em asilos, mas que não estivessem em situação de rua. Sayuri comenta que o dia da entrega das colchas foi muito importantes para as idosas. Ao entrar em contato com outras idosas que vivem em instituições e não vêm suas famílias, que muitas vezes não as visitam ou só visitam no Natal, elas puderam perceber seus privilégios e ressignificar suas vidas a partir dessa vivência.

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