A história do projeto Arte na Terra é longa e tem seu embrião na década de 80, quando a prática pedagógica e transformadora da agrofloresta começava. Naquele período, a fazenda São Luiz, em São Joaquim da Barra/ SP, já possuía muitos dos seus atrativos de hoje, como o patrimônio natural com belas cachoeiras e o histórico, de uma fazenda de café centenária. Lá, dois casais de amigos, e dentre eles Denise Amador e Rodrigo Junqueira, começaram a praticar o sistema de plantio agroflorestal. Eles juntaram experiências e partiram para a gestação de um projeto unindo a agrofloresta ao trabalho educacional. Mas, por vários motivos, a concepção deste sonho teve que esperar.
Mais tarde, uma usina de cana na mesma região da fazenda São Luiz implantou um projeto de readequação ambiental com a participação de um professor da ESALQ (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz – USP Piracicaba), amigo de Denise, e isso permitiu a conexão com a ideia do Arte na Terra. O fato da usina pertencer à familiares de Rodrigo Junqueira também facilitou o acesso e os dois foram saber se havia verba também para a estruturação básica da fazenda São Luiz dentro do projeto de readequação. O objetivo era a reforma de estruturas históricas de produção de café e a construção de cozinha e banheiros para receber pessoas. Os proprietários da Usina aceitaram a proposta imediatamente e proveram um recurso que, somado à renda da fazenda, viabilizou as reformas até então tocadas somente pelo casal.

Em 2001, Denise e Rodrigo conheceram um grupo de arquitetos, jornalistas, biólogos e advogados que estava começando uma ONG de Educação Ambiental em Ribeirão Preto, e os convidaram para fazer uma vivência na fazenda. O dois compartilharam a ideia de realizar o projeto de educação ligado à agrofloresta na fazenda, e o Arte na Terra, ainda sem seu nome de batismo, começou a ser gestado.
Entre 2001 e 2002, esse grupo de profissionais se encontrou mensalmente para experimentar oficinas de teatro, lixo, agroflorestal, papel reciclado e foi se concebendo o que queria: educação ambiental crítica, baseada mais em vivências do que em conteúdos, para que as pessoas pudessem sentir e colocar a mão na massa, pegando a enxada para plantar árvores.

“Beirava a espiritualidade porque vivenciava essa relação com a natureza e era totalmente cooperativa. Nós fazíamos oficinas sobre o que é meio ambiente, o que é educação ambiental; e tiramos nossa missão e o que era educação ambiental para nós”, lembra Denise Amador.
O processo de concepção do projeto Arte na Terra foi muito rico e tinha muito mais características de uma ONG do que uma empresa, mas, por razões burocráticas, eles resolveram cria-lo como uma microempresa em 2001. Todas as reformas necessárias foram realizadas e, em 31 de agosto de 2002, eles receberam o primeiro grupo de professores da região para conhecer a proposta, gratuitamente. Nascia ali a primeira turma do projeto Arte na Terra.
Esse tipo de trabalho de educação ambiental no interior de São Paulo foi uma novidade à época e ainda o é: ainda que o movimento venha crescendo cada vez mais, a iniciativa é inovadora por trazer a pauta ambiental para um cenário orgulhoso de pertencer ao agronegócio e, principalmente, por oferecer uma visão crítica ao sistema monocultor através da agrofloresta.
Denise conta que a formação da base do Arte na Terra era cooperativa: “uma das educadoras era professora de educação física e pautava que não haveria nada competitivo dentro do projeto”. Essa cooperação era vista nas relações entre plantas e animais na natureza o tempo todo, e essa ligação também seria feita pelo projeto.

Educação para além da sala de aula
O Arte na Terra foi divulgado para as escolas da região de São Joaquim da Barra, que não tinham hábito de tirar os alunos da sala de aula, e o interesse foi crescendo aos poucos. Algumas delas participaram uma vez, outras foram várias vezes e há escolas que levam turmas à fazenda São Luiz até hoje. Estas, inclusive, colocaram o projeto Arte na Terra no eixo pedagógico e se tornaram clientes assíduas.
Em 2005, Rodrigo e Denise começaram a receber escolas Waldorf para os Estágios Agrícolas*. No início, as crianças e adolescentes iam passar o dia realizando atividades onde a criatividade era experimentada em vivências e dinâmicas de contato com a natureza. Esses Estágios criaram trabalhos de campo voltados para a sensibilização, conexão com a natureza e observação do solo, totalmente sensoriais.
A transformação produzida pelos Estágios Agrícolas
Os *Estágios Agrícolas foram concebidos por Rudolf Steiner, para alunos do 9° ano de escolas Waldorf, e são baseados no contato com o mundo do trabalho no campo, com a ideia primária de produção de alimentos. “É trabalho mesmo, pra ficar com bolha nas mãos, pra tirar leite de manhã, catar o esterco do curral e levar pra composteira, fazer canteiros, podar árvores…”, explica Denise.
Nas escolas Waldorf, esse contato com a produção de alimentos em escolas varia muito e depende muito do professor, explica Denise, “às vezes se restringe a plantar um milho, acompanhar o crescimento e colhê-lo. Mas o INOV (Instituto Ouro Verde), por exemplo, valoriza mais esta prática e tem a agroecologia no currículo do 1° ao 9° ano; já em outras escolas, esse tema é tratado pelo professor de biologia, que não é especialista em agroecologia”, conta a educadora.

20 anos para serem comemorados
Agora em 2022, as equipes para os trabalhos de campo e Estágios Agrícolas tem sido montadas para acompanhar a demanda das escolas e os passos tem sido dados “de acordo com as nossas pernas”, explica Denise. “Nós poderíamos ter mais comemorações esse ano mas, para o tamanho da nossa equipe, temos feito o que é possível. Inclusive, uma boa parte dos recursos da Saúva deste ano será para os 20 anos do Arte na Terra e 100 anos da Fazenda São Luiz”, celebra a coordenadora do projeto.
Para os 100 anos da fazenda, está sendo montado o Centro de Memória da Fazenda São Luiz, que também é um espaço educador importantíssimo do Arte na Terra. É um espaço histórico com maquinários e equipamentos antigos, que são abordados contando a história da região. Este trabalho conta com a consultoria de historiadores da UNESP/Franca em sua concepção. Com isso, o Arte na Terra ganha um espaço educador mais estruturado em conjunto com a Fazenda São Luiz. “No dia 26 de novembro, faremos uma festa de 20 anos do Arte na Terra e 100 anos da fazenda para colaboradores, amigos e escolas parceiras. Será um dia cultural com apresentações teatrais, musicais e roda de conversa”, adianta Denise Amador, coordenadora do Projeto Arte na Terra.
Além disso, o projeto vai lançar um vídeo em comemoração aos 20 anos do Arte na Terra, fruto também da parceria com a Saúva, com conteúdo artístico e documental.