É comum quando alguém se apresenta indicar sua profissão, formação acadêmica ou área principal de atuação. Vários são profissionais da área de saúde, advogados, produtores, engenheiros, artesãos, programadores, músicos, futurólogos, atletas, criadores de comunidades, economistas, desenvolvedores, artistas, hackers… a lista é extensa. Estava pensando em uma forma de me apresentar, de nos apresentar.
Quem somos nós na Jataí e na Saúva? Não me sinto empoderado para classificar, mas arrisco uma “profissão” em comum que temos. Ou que somos. Amadores.
Se estamos tentando viver em um mundo melhor, ainda inexistente, que precisa de uma participação intensa, de efetiva cocriação para que seja real, podemos imaginá-lo agora… Um ambiente onde se estimule a criação de um tecido social baseado em relações de confiança e apoio mútuo; onde o engajamento é livre, mas o comprometimento é coletivo; onde as premissas ecológicas sustentem as decisões econômicas. Pense no estímulo ao mérito, em que as externalidades sejam incluídas nas decisões empresariais, numa circularidade econômica presente em absolutamente todas as áreas, seja no aspecto produtivo, seja no societário, onde exista integridade e todos os seus membros participem de todas as etapas da cadeia de valor. Leve sua imaginação na busca de uma atuação em rede ampla e em sintropia, sem conflitos de interesses (precisamos enxergar e aceitar somente os interesses interessantes, não interesseiros…); onde o exercício da autoeducação e a vontade em aprender sejam o motor das relações; no apreço pelo respeito aos acordos decididos sociocraticamente e em liberdade; na valorização à diversidade em todas as suas manifestações e não no olhar para a desigualdade. Imagine o incentivo à regeneração das empresas e relações ambientais, inclusive as humanas.
Como cocriar esse mundo? Tentando atuar em um sistema regido por esses princípios, foram criadas as instituições Jataí e Saúva. Elas surgem como instrumentos facilitadores de Redes de negócios e de relacionamento alinhadas com esses interesses. Ambas podem ser vistas como uma plataforma de alocação de recursos movida pela causa de desafiar o sistema, suas múltiplas relações e impulsionar lógicas mais saudáveis e sustentáveis de funcionamento.
Nas suas práticas, Jataí e Saúva preservam a existência humana com colaboração e mérito, buscando reduzir a desigualdade com foco na melhoria das condições socioeconômicas dos mais vulneráveis ou da base da pirâmide.
Ainda, priorizam a circularidade equilibrada nas cadeias de valor, prezam por liberdade responsável e honestidade de propósito nos processos decisórios. Sem deixar de considerar a lógica de contemplar as premissas agroecológicas, sociais e demais externalidades nas decisões econômicas e empresariais.
São inúmeras variáveis, modelos, conceitos e atividades necessários para desenvolvermos efetivamente esses valores em nossa comunidade; uma verdadeira revolução de novos caminhos, comportamentos, relacionamentos e premissas. Um desses modelos chamamos carinhosamente de economia do ciclo em espiral, uma denominação diferente das usuais por nos permitirmos aprofundar os detalhes de sua constituição. Este modelo está sendo testado nas iniciativas da Jataí e Saúva e será tema de discussão de nossos textos por aqui.
Um modelo circular, aplica o conceito de educação continuada e inclui todos os agentes dentro de um processo produtivo. A circularidade econômica ocorre de forma ampliada em toda a cadeia de valor, considerando os meios de produção, canais de comercialização, fontes de financiamento e a produção e consumo eficientes em um mesmo círculo.
Nessa partida, no egresso e durante nossa caminhada, olhamos muito para dentro e buscamos completar um círculo, regressando para as bases vitais. Nesse fluxo, porém, o regresso tende a superar o egresso, criando um super-gresso. O ponto de retorno não coincide mais com o ponto de partida, não fecha realmente um círculo; ele se abre em uma espiral onde a dita chegada está em outro eixo, acima do ponto de partida. O regresso supera o egresso porque entre eles existe um ingresso, uma olhada para dentro, uma evolução.
O ciclo econômico em espiral indica um processo de construção e aprendizado constante: crescemos, construímos, desenvolvemos, e nunca voltamos ao mesmo ponto, evoluímos em outra dimensão no círculo…
Estamos buscando conviver com um modelo de relacionamento onde os participantes do “ciclo” sejam autossuficientes, dependendo cada vez menos de agentes externos, sejam eles financeiros, de insumos produtivos ou de consumo. É possível que um pequeno produtor de alimentos tenha o seu próprio banco? Ou um empresário de cosméticos pode vender seus produtos sem intermediários? Será que uma comunidade pode ter sua própria moeda e não depender de dinheiro de terceiros? Talvez uma escola possa ter sua própria plataforma de crowdfunding? Essas perguntas, aparentemente, são difíceis de fazer sentido, mas estamos no fluxo para que esse modelo mental seja aceitável e que esse modelo econômico seja possível. Um caminho trilhado com muito trabalho, com muito amor.
Precisamos ser amadores em tudo o que fazemos. Às vezes, ser profissional leva a caminhar pela profissão, por uma construção mental predeterminada, com inputs e outcomes já desenhados e previstos. Repensar essas construções mentais, esses modelos econômicos e sociais que estão nos levando a caminhos não desejados é parte fundamental da jornada que queremos trilhar.
Sejamos amantes do fluxo. Amadores da construção da economia do ciclo em espiral.
Algumas premissas que nos conduziram até aqui precisam ser revistas. É necessário reescrever as bases de atuação para que não haja concentração demasiada de capital e poder, gerando desigualdade e escassez. Parece imprescindível um mundo regenerativo e distributivo por definição e não como consequência dos atos. Assim, as coisas (no sentido mais amplo da palavra, não no sentido utilitário de recursos) têm a possibilidade de coexistência, disponibilidade e abundância.
Como fazer isso? Ainda não sei. Estamos caminhando.