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Palhaçaria hacker e tecnomagias do blackchain: reflexões, esperanças e mandingas

A palhaçaria se constitui na episteme geradora da fricção criadora de um mundo ao revés. Uma persona cuja existencialidade está baseada no amplo espectro das gramáticas fantásticas transversais ao poder vigente. Os sentidos de pertencimento de cada existencialidade são mediadas pelas sofisticadas elaborações contidas nos erros, nas rasuras, nos mistérios sensíveis de um tempo espaço encantado. Um mundo fundado no reconhecimento, no acolhimento amoral das diferenças e impermanências que constituem o fluxo do cosmos no qual estamos inseridos.

A palhaçaria se constitui na episteme geradora da fricção criadora de um mundo ao revés. Uma persona cuja existencialidade está baseada no amplo espectro das gramáticas fantásticas transversais ao poder vigente. Os sentidos de pertencimento de cada existencialidade são mediadas pelas sofisticadas elaborações contidas nos erros, nas rasuras, nos mistérios sensíveis de um tempo espaço encantado. Um mundo fundado no reconhecimento, no acolhimento amoral das diferenças e impermanências que constituem o fluxo do cosmos no qual estamos inseridos.

Hoje, a humanidade vive o desafio urgente de reconfigurar o modelo de sociedade hegemônico e falido, baseado na escassez, na competição, na concentração de renda, na exclusão e desconexão com o fluxo natural de um dos universos que acreditamos habitar.

Por isso, trago aqui reflexões de um palhaço negro, latino-americano, de 54 anos, nascido na periferia da cidade do Rio de Janeiro, em pleno solstício, no dia de festejar São João e Xangô e que hoje se autodenomina um germinador de processos coletivos, um Palhaço hacker, um Exu laboral1 e um dos cocriadores da rede Muda Outras Economias.

Vivemos a urgência ontológica de construir a equação enunciada pela sequencia dos três livros de Ailton Krenak: “Ideias pra adiar o fim do mundo”, já que a “Vida não é útil” e “O amanhã não está a venda”.

Sendo assim, dentre uma das teorias possíveis, a alternativa é confluir nos modos de organização social dos povos tradicionais. Começarmos a acessar os softwares com sistemas operacionais processadores de abundância, inclusão, compartilhamento, respeito às diferenças e à alteridade entre as múltiplas vidas que coexistem conosco neste planeta.

A mercantilização da vida e do saber, gerada pela monocultura do pensamento branco, ocidental, monoteísta e heteronormativo, está fundada na limitação do pensamento binário e no sequestro ancestrálico dos saberes e tecnologias humanas desenvolvidas há anos pelos povos negros e indígenas espalhados pelo mundo.

Importante voltarmos para localizar alguns conceitos que utilizo para entender onde está fundamentada a prática que leva um palhaço a cocriar a brincadeira de uma moeda complementar e assim, coletivamente, promover a ressignificação das palavras dinheiro e economia.

Talvez o mais importante seja entendermos que existimos a partir das palavras, e com elas damos sentidos à vida em sociedade. Através das palavras nomeamos e nos afetamos, abrimos portas para experiências empoderadoras e também para práticas opressoras.

nomear o que fazemos, em educação ou em qualquer outro lugar, como técnica aplicada, como práxis reflexiva ou como experiência dotada de sentido, não é somente uma questão terminológica. As palavras com que nomeamos o que somos, o que fazemos, o que pensamos, o que percebemos ou o que sentimos são mais do que simplesmente palavras. E, por isso, as lutas pelas palavras, pelo significado e pelo controle das palavras, pela imposição de certas palavras e pelo silenciamento ou desativação de outras palavras são lutas em que se joga algo mais do que simplesmente palavras, algo mais que somente palavras”.Jorge Larrosa Bondía, em “Notas sobre a experiência e o saber de experiência” – 2002

Então, junto à rede Muda Outras Economias, estou alimentando uma poética, juntando múltiplas cosmovisões encantadas, tendo a brincadeira como o campo do esquecimento, que assim me permite fabular, operar no alargamento dos sentidos com os olhos que vêem, uma memória que revê e uma imaginação que transvê o mundo.

Assim o palhaço, o hacker e o Exú estão lado a lado atuando no campo do invisível, criando mágicas e encantamentos de uma tecnomagia para a vida cotidiana. Processando um conjunto de sistemas que rompem com o modelo sintético, implodindo a falácia de vida como mercadoria que é ativada dentro de nós mesmos, com um chip que o sistema tenta nos implantar.

Ensaiando possibilidades na terra, multitudes de territórios habitados por capacidades, cujas lógicas fantásticas estão em permanente ebulição. Gerando esse curto-circuito na capacidade de governar o mundo, esse bug na governança universal.

Com olhar de poesia localizo o Palhaço e o Orixá Exú* como agentes que rompem, com a velocidade de um gerador atômico amoroso, o estado de letargia das coisas e das pessoas, e conferem a vivacidade que estava morta ou nem nasceu.

São esses seres, agentes voláteis, inacabados, que possibilitam o trânsito entre o visível e o invisível, o que acontece pra além da própria realidade que precede cada acontecimento da vida cotidiana. Diz o Itan que “Exú matou o passarinho ontem com a pedra que atirou hoje” .

O palhaço é um perdedor, que ganha pela potência empática da sua fragilidade, dos seus erros e limitações. O palhaço, fabulador do impossível, nos mostra que quando somos dignos dos nossos acontecimentos, independentes da moral monoteísta, do certo e do errado, os corpos ganham potências germinadoras de humanidades.

O hacker é aquela pessoa que se dedica, com intensidade incomum, a conhecer e modificar os aspectos mais internos de dispositivos e programas para avaliar as fraquezas do sistema, auxiliar na formulação de defesas ou descobrir algo especial em um sistema qualquer que antes não parecia possível.

Economia advém da palavra do grego oikos e significa “casa, lar, domicílio, meio ambiente”. Na sua origem, portanto, economia é a arte de bem administrar a casa.

A casa pode ser o planeta, o país, a cidade e nosso corpo. Assim configuramos nosso território-terreiro-quintal, para reafirmar a vida como uma identidade, um sentimento de pertencimento, de onde mediamos as relações de trabalho, moradia, alimentação, compartilhamentos materiais, espirituais e tudo que possibilita a existência plena de toda a comunidade.

São justamente esses laços negros, que o blackchain vai articular, fortalecer e compartilhar. Um fluxo farto de muitas riquezas ligadas a outras formas de pensar fora da caixinha.

Como diz a música:

Se um outro mundo é possível
É claro que eu vou experimentar
Um mundo ao contrário de ponta a cabeça
Tudo bem minha cabeça nunca esteve no lugar…
Somos criadores do impossível
Somos outra forma de pensar
Vamos criar outra realidade
Então cola no bonde, vem pra Muda vem mudar.

1 – O agente que alimenta o movimento gerador de cruzos e atravessamentos nos modos de pensar, produzir, e desfrutar o campartilhamento das riquezas.

2 – Musica composta por Dalmo Latini e João Carlos Artigos – 2020

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