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Ação socioeducativa coletiva do PAFE, no Instituto Ouro Verde, exalta o Dia da Consciência Negra

Matéria publicada em 9 de novembro de 2024.

A manhã do dia 19 de novembro de 2024 foi especialmente diferente no Instituto Ouro Verde, o INOV, em Nova Lima/MG. Em comemoração ao primeiro feriado nacional do Dia da Consciência Negra, os educadores e educadoras apoiados pelo PAFE – Programa de Apoio à Formação de Educadores e Educadoras, propuseram uma ação coletiva com oficinas na escola sobre o tema “educação antirracista”. A ação contou com o apoio e colaboração dos professores e foi aprovada pelo Conselho Pedagógico e Comissão de Ações Afirmativas. A manhã foi toda voltada para temas da cultura afrobrasileira, dentro e fora das salas, e movimentou a escola da horta às salas do Ensino Fundamental. Foi uma oportunidade para os oficineiros levarem conhecimentos ancestrais afrobrasileiros para os estudantes e criarem um ambiente de trocas a partir daí. Além de Sandra Gonçalves, representando a Saúva, PAFE e INOV, as ações contaram com representantes da comunidade do INOV, Associação AMANU, UJIMA – Cozinha Viva e Lá da Favelinha.

“Isso é muito legal pela experiência de trocas. As pessoas de outros projetos tiveram a oportunidade de conhecer a escola e o trabalho do INOV, e de oferecer oficinas para essa comunidade. Essa experiência é muito bacana para todo mundo, tanto para a escola que os recebeu como pra eles que vêm de outros projetos apoiados pela Rede”, conta Fabíola Guadix, Coordenadora do PAFE.

As atividades começaram com a apresentação das Ações Afirmativas da escola e da Orquestra Ouro Verde interpretando a canção “Bola de Meia, Bola de Gude”, de Milton Nascimento. Logo depois foi a vez da Rainha Belinha (Isabel Casimira Gasparino) e do Congado dos 4° e 7° ano se apresentarem, seguidos de uma conversa sobre o Congado com a Rainha Belinha. As diversas oficinas começaram logo cedo, com “Nendo Dango” – bolas de argila com sementes; horta temática; culinária/mugunzá; capoeira; plantas medicinais; impressões botânicas em argila; tranças Nagô; instalação de escultura em cerâmica para abelhas; turbantes; impressões de símbolos Adinkras; capoeira Angola e, ao final, foi oferecido um almoço pela UJIMA para os integrantes do PAFE.

“Essa agressividade contra o povo negro, essa vontade que a gente não cresça, essa mania de querer dificultar as coisas para o povo preto já estava no DNA de quem construiu a cidade de Belo Horizonte. Mas como entendemos isso? Estudando, aprendendo, respeitando o outro. Não achando que somos melhores porque somos brancos, pretos, porque somos bonitos, temos olho azul, olho verde… Nós somos pessoas iguais”

Isabel Casimira Gasparino – Rainha Belinha

A conversa com a Rainha Belinha trouxe informações importantes de sua história pessoal e do povo negro em Belo Horizonte

A riqueza da Cultura Afrobrasileira

A atividade 1, proposta por Thiago Ratton, contou sobre a história e cortejo do Congado conversando com Isabel Casimira Gasparino (Rainha Belinha), e as musicistas Marcela Nunes e Maiara Barros no apoio. Foi apresentada a Guarda de Congo e Moçambique Treze de Maio de Nossa Senhora do Rosário, fundada em 1944 no Bairro Concórdia, Belo Horizonte. Belinha é neta de Maria Casimira das Dores, mulher preta, parteira, benzedeira e escolhida primeira Rainha do Congo do estado Maior de Minas Gerais. Após o falecimento de sua mãe, Dona Isabel Casimira, Belinha foi indicada para assumir as funções de Rainha do Congo de Minas Gerais, representante dos Reinados do Rosário no Brasil.

A atividade 2, ministrada pela Associação Amanu, ofereceu uma oficina de plantas medicinais e plantio agroecológico com Ubiraci, Milena, Luiz e Shirley. Nela foram apresentadas e descritas as mudas, usos e benefícios das plantas medicinais na cultura africana. Ao final, demonstraram algumas práticas e fizeram um plantio agroecológico com os estudantes nos canteiros da horta da escola.

A atividade 3 foi proposta por Lorrane Katlen, do projeto Lá da Favelinha, e ofereceu uma oficina de tranças com a técnica Nagô. Lorrane apresentou a importância das tranças na cultura africana, apresentando imagens e, em seguida, ensinando a técnica às alunas. Uma das curiosidades apresentada na oficina foi que os pretos traziam sementes de suas terras, escondidas em suas tranças, para se alimentarem onde foram levados. Em determinado momento, as tranças também indicavam o caminho escondidos para os quilombos.

Lorrane conta que gostou muito da ideia de uma ação socioeducativa coletiva, para além das ações individuais, que surgiu nos encontros e Mesas de Trocas. Ela também diz que se encantou com o INOV, porque é muito diferente das escolas que conhece, pela proximidade com a natureza, o contato com as plantas, a alimentação produzida lá e a pedagogia diferenciada. Lorrane fez uma pesquisa extensa sobre tranças e cabelo crespo quando começou a trançar profissionalmente há dois anos. “Nós fomos muito bem recebidas. (…) As meninas estavam muito engajadas e algumas delas já tinham conhecimentos sobre tranças, mas não com a técnica que ensinei. Foi legal perceber a curiosidade sobre o cabelo crespo e pude passar um pouquinho disso pra elas. O mais interessante e empolgante foi ver as meninas praticando as tranças nas colegas. Enquanto uma trançava, a outra era modelo e vice-versa. Toda essa ação coletiva foi muito rica para mim quanto para elas”, afirma Lorrane.

A atividade 4, proposta por Eunice de Jerusalém e Camila Meireles da UJIMA, apresentou a origem e história do mugunzá (canjica doce) na cultura africana. O prato foi preparado no espaço da cantina junto das crianças, que participaram do processo e degustaram em seguida.

A atividade 5, ministrada por Igor Reis, ofereceu uma oficina de escultura de cerâmica feita para atrair abelhas sem ferrão e plantio de espécies nativas atrativas para abelhas. As esculturas foram feitas em colaboração com crianças do Bairro Vila Industrial (Nova Lima) e serão instaladas na Escola Harold Jones e Instituto Ouro Verde.

A atividade 6, proposta por Jéssica Martins, foi de impressão botânica em placas de argila, utilizando as plantas medicinais trazidas pela Associação Amanu com as descrições sobre estas.

A atividade 7, proposta por Moritz Hondrich, foi de uma oficina de Capoeira Angola. Nela, foi feita uma breve introdução da história, movimentos básicos, instrumentos, ritmos e canções da Capoeira Angola.

A atividade 8 foi proposta por Lúcio e Marcela Melo sobre impressões de símbolos Adinkras. Esses símbolos foram gravados em batatas e impressos em tecido com tintas naturais como beterraba e açafrão.

A atividade 9, ministrada por Igor Reis, propôs uma oficina de “Nengo Dango”. Nela, foram fabricadas bolas de argila com sementes para serem usadas como reflorestamento. Essa técnica é utilizada no Japão e difundida pelo japonês Masanobu Jukuoka. Na oficina foram usadas sementes de plantas nativas e africanas trazidas para o Brasil para beneficiar os polinizadores e consequentemente os biomas. Os estudantes pegaram uma medida de sementes e misturaram com uma medida de terra da composteira da escola e argila, fazendo uma bola e armazenando-as em um saquinho. Essas “bombas de sementes” poderão ser jogadas em pontos específicos da escola em períodos chuvosos.

A atividade 10 foi ministrada pela convidada Jhei e apresentou a origem e importância dos turbantes na cultura africana. Nessa oficina os tecidos foram trazidos pelos estudantes.

Tana Guimarães, professora do INOV, participou da oficina de turbantes e se disse muito bem impressionada com a alegria, entusiasmo e disposição das crianças nesse dia especial, mas sobretudo dos jovens “porque não é fácil motivá-los”. Ela continua dizendo que foi “muito bonito ver essas pessoas pretas como referências, os professores nesse dia. Essa riqueza de pessoas extremamente competentes e capazes, com muito a dizer e os alunos com olhos e ouvidos atentos”. Tana conta que, na avaliação do Colegiado, eles perceberam o quão importante é diluir essas ações ao longo do ano para que faça parte da rotina da Escola.

Cathia Figueiredo, da comissão de Comunicação do INOV, registrou todas as oficinas e se disse impressionada com a qualidade das oficinas e como elas trouxeram informações importantes que contribuem com o respeito às culturas afrobrasileiras. Ela contou que aprendeu sobre cada modelo, dobra e formato dos turbantes que indicam as linhagens e realezas dos povos africanos. “É interessante conhecer a cultura viva dos povos, com respeito, para que possamos interagir de maneira verdadeira”, disse ela. Cathia também gostou de saber mais sobre as origens do Bairro Concórdia (os pretos que moravam na área central da cidade “concordaram” em se mudar para aquela região periférica) e da Lagoa da Pampulha em Belo Horizonte (o bisavô da Rainha Belinha trabalhou na construção da represa, que foi feita com o intuito de tornar a Pampulha um lugar para a elite) e como elas estavam ligadas aos pretos escravizados. As origens africanas e indígenas de certos alimentos do nosso cotidiano também despertaram a curiosidade dos participantes, o que fez surgir a ideia de criarem um mural para divulgar essas informações quinzenalmente. “Com isso podemos nos enriquecer, abrir e ampliar nosso olhar para as culturas dos povos. Isso foi o que achei mais legal”, conclui.

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