A Rede Alegrias começa, agora em março, o Banco Comunitário Alegrias. O projeto tem apoio da Carta Convite Saúva 2022 e entra na primeira fase com a criação de um grupo piloto para ampliar o entendimento e a vivência das Alegrias em Paraty (RJ). A moeda complementar Alegrias já circula na cidade com sucesso entre várias pessoas e empreendimentos, tendo lastro em dons, prestação de serviços e produtos; mas, para aumentar o alcance e o uso da moeda, a partir de agora, ela também será lastreada em reais.
Há algum tempo, os gestores da Rede Alegrias percebem que algumas pessoas acumulam muitas Alegrias e não as fazem circular pelas limitações da cadeia produtiva dentro Rede: há a necessidade de ampliar o alcance da moeda para produtos e serviços mais cotidianos e disponíveis em Paraty. Por isso, o Banco Comunitário Alegrias começa com o aperfeiçoamento da moeda e ampliação dos seus usos.
Mônica Calderón, uma das gestoras da Rede Alegrias, conta que é muito difícil criar uma economia e sustentar uma moeda que seja aceita somente por ela, dentro do universo da Rede. Dessa forma, ela explica, é necessária uma moda Fiat (moeda fiduciária emitida por governos e bancos centrais) para dar apoio e complemento à moeda social. Para fechar o circuito de produção, circulação e comercialização de produtos na economia de Paraty, tem de haver um lastro em reais para que outros produtos e serviços entrem na roda. E este é um dos pontos de partida para o funcionamento do Banco Comunitário Alegrias.
Dificuldades que geram oportunidades
Com o projeto-piloto promovendo a ligação entre as moedas Alegrias e Real, a Rede paga os serviços de gestão, comunicação e serviços de créditos em pequenas quantias de moedas sociais lastreadas. Ainda dentro deste piloto, fica o compromisso para que todos esses prestadores invistam as Alegrias nos produtores locais ligados à Rede. Assim, além de promover os negócios locais, vai se criando uma cadeia de circulação do capital dentro da comunidade.
Calderón explica : os Reais lastreiam as Alegrias que pagam os prestadores de serviços; e estes apoiam os produtores consumindo seus produtos e serviços. “Além disso, conseguimos outros parceiros, serviços muito importantes, como posto de combustível, gás de cozinha e farmácia, (…) que podem ser adquiridos em Alegrias. Isso tudo além de alimentos de qualidade, da Alimentos Alegrias, da rede de produtores orgânicos de Paraty e de pescadores que entraram nessa nova fase”, conta a gestora.
Parcerias e circularidade
Mônica Calderón conta que estava com receio de falar sobre moedas comunitárias com a gerência de um posto de gasolina, da BR Distribuidora, mas se surpreendeu: após a apresentação, a gerente do posto entendeu o funcionamento da moeda complementar e marcou um encontro com o dono do posto, que também gostou da ideia mas queria saber como o dinheiro chegaria até ele. Calderón explicou o processo do lastro e ficou acordado que as Alegrias que entrassem para o Posto seriam usadas em produtos da Rede.
Contudo, havia um empecilho: o consumo do novo parceiro pelos produtos oferecidos até agora pela Rede Alegrias era muito baixo. Então, “sugeri que ele pegasse as Alegrias que recebesse e as transformasse em cestas orgânicas, compradas dos produtores, para serem distribuídas nas comunidades de Paraty” (ação que o proprietário do posto de gasolina já realizava de forma independente). Com isso, a parceria foi celebrada: “esse recurso vai entrar na economia e vai continuar circulando (na Rede), porque o que nós não queremos é que esse recurso saia da nossa rede”, conclui Mônica.
Em outra situação anterior, quando os produtores eram apoiados e recebiam parte do que vendiam em Reais, esse dinheiro era utilizado na cidade em fornecedores e serviços que ainda não trabalhavam em parceria com a Rede Alegrais e a verba saía do círculo. Agora, os produtores recebem esse dinheiro mas ele continua circulando dentro da Rede, porque a garantia é a moeda social. O grande desafio para Mônica agora é “ver quantas vezes esse dinheiro vai circular dentro da nossa rede, quanto de dinheiro que recebemos no início do processo estará lá no final. E vamos ver se realmente conseguimos nos tornar sustentáveis. Quanto de dinheiro, de abundância, nós criamos com o dinheiro que entrou”.
Banco piloto
As pessoas que participam desse projeto piloto, entre 20 e 30 prestadores de serviços e produtores de bens e alimentos, tem a possibilidade de solicitar o câmbio por reais, caso não consigam reinvestir todas as Alegrias dentro da rede. Essa é a função do Banco Comunitário, porém, a ideia e o acordo que estão fazendo com todos é que as pessoas evitem fazer a troca por Reais. Quando essa troca é realizada, não se sabe para onde esse dinheiro vai e, ao contrário, se continuar circulando em Alegrias, é possível saber exatamente para onde o recurso está indo. A circulação e o monitoramento dessa economia vai depender muito do compromisso das pessoas em fazer circular a moeda complementar social.
Fundo Rotativo Solidário
Uma estratégia muito utilizada pelos Bancos Comunitários é o Fundo Rotativo Solidário. Eles funcionam para apoiar, com pequenos empréstimos ou créditos, produtores que precisam fazer algum investimento com juros muito baixos e que são reinvestidos na gestão do próprio banco ou em outros empréstimos.“Uma parte desse recurso da Saúva vai servir como fundo de reserva para fazer esses pequenos apoios a produtores que retornarão esse dinheiro com o fruto do seu trabalho. Isso é uma super boa notícia”, comemora Mônica.