Com a redução dos casos graves de Covid e a flexibilização do isolamento social, o agendamento pelos Estágios Agrícolas na fazenda São Luiz, em São Joaquim da Barra/SP, retornou. Além disso, pedagogos, professores e profissionais de saúde pesam também nas decisões para atividades os benefícios do convívio social na saúde e educação de crianças, adolescentes e jovens; em virtude do longo período de reclusão e contração do desenvolvimento. Por isso, o projeto “Arte na Terra“, que promove vivências em agroecologia, agrofloresta e alimentação orgânica, retoma as atividades observando os cuidados e precauções ainda necessários para atividades em grupo, conscientes da potência destas experiências para o momento atual.
Os Estágios agrícolas são atividades pedagógicas de todos os nonos anos de escolas que se baseiam na Pedagogia Waldorf. Concebido por Rudolf Steiner, a proposta do Estágio agrícola é promover para os adolescentes uma imersão no mundo rural, com a dimensão do trabalho e de atividades que exigem força, determinação e persistência. A Fazenda São Luiz começou a receber escolas Waldorf para a realização dos estágios em 2005 e, desde então, recebe todos os anos pelo menos seis escolas Waldorf. “Os jovens são convidados a embarcar no nosso sonho de transformação agroecológica participando das atividades da Fazenda na Agrofloresta, Horta agroflorestal, Sementes e viveiro de mudas, Abelhas melíponas, Plantas medicinais, Culinária, Retiro do leite, e também em momentos com trilhas, fogueiras, jogos e brincadeiras. As Agroflorestas são verdadeiros portais para reconexão com a natureza, trazendo a participação humana para os processos naturais de vida. Os jovens adoram participar dos manejos realizados com facões, tesouras e serrotes para podar árvores e organizar a biomassa no solo, numa dimensão de cuidar dos solos e das plantas, fazendo parte de processos regenerativos do planeta”, explica Denise Amadora, uma das coordenadoras do projeto.
Em abril e maio, o “Arte na Terra” recebeu duas escolas (Micael e Rudof Steiner de São Paulo) e, hoje, tem mais agendamentos para os próximos meses. Pela primeira vez, vai juntar duas turmas de estudantes, de Bauru e Piracicaba, em um único período. Vale ressaltar que todos estudantes são testados antes de irem para o estágios.
Denise Amador percebe, hoje, uma diferença na participação dos jovens após a pandemia. Alguns ficam mais isolados, sem querer contato físico, como abraços, e outros demonstram crises de ansiedade, porém no final da semana imersiva, apresentam mudanças significativas com sorrisos e um novo olhar sobre a vida.

Vivências educativas e antidepressivas
Ao mesmo tempo, Denise observa que “a vivência tem sido muito representativa e mais significativa do que nunca, pois é um momento em que eles (estudantes) saem de casa, do conforto dos sofás e das telinhas; chegam aqui sem celular, sem sinal de internet e vamos trabalhar na terra, conectar com a terra, viver os ciclos, acordar cedo, ver estrelas, ver o sol, realizar trabalhos, comer alimentos colhidos por eles e então criar vínculos com a terra, a saúde e o corpo”. Assim, o Estágio termina por servir, também, como redutor dos impactos negativos do isolamento, abrindo janelas para novas oportunidades, lentamente e no tempo de cada participante.
Já foi comprovado cientificamente que mexer com a terra e lidar com plantas tem efeito terapêutico. “Os efeitos de tais atividades são considerados antidepressivos naturais. O contato com os elementos da natureza tanto aumenta a disposição como promove relaxamento. Desestressa. No momento em que mexe na terra, a pessoa está canalizando a atenção para algo que dá prazer”, explica a psicóloga Sâmia Simurro, vice-presidente da Associação Brasileira de Qualidade de Vida (ABQV), em entrevista ao Correio Brasiliense.
Por isso, o Estágio Agrícola vai além do aprendizado sobre o trabalho no campo; ele ajuda a manter a qualidade de vida e evita doenças como depressão e estresse. Toda vivência colabora para trazer novos olhares e posturas sobre a vida. O simples contato com bactérias presentes no solo pode combater processos inflamatórios e complicações psíquicas, fora o prazer do mero ato de tocar a terra, aprender algo novo, desenvolver uma atividade fora da rotina da cidade. Esses benefícios já foram demonstrados através de dados como o aumento da produção de serotonina, hormônio relacionado ao prazer; justamente após o contato com uma bactéria específica do solo, a Mycobacterium vaccae.

“Normalmente, o jovem chega um pouco ressabiado, receoso sobre o trabalho e a semana que virá e assistimos a alguns momentos de relutância com o trabalho; mas, no final ,sempre saem com muita bagagem, muita gratidão. E experiências vividas que dizem ser das mais importantes da vida, inesquecíveis e de uma profundidade bem interessante, que o trabalho com a terra promove”.
Denise Amador – Educadora e pesquisadora do “Arte na Terra”, da Fazenda São Luiz
Com o apoio da Saúva, os gestores do “Arte na Terra” tem investido na estruturação do Espaço Educador e as reformas, melhorias e manutenção da fazenda tem sido feitas com recursos próprios. Desde o começo de 2022, foram realizadas reformas no alojamento, nas pontes e na casa para estagiários; e o objetivo é aprimorar ainda mais a experiência dos estudantes no Estágio.

A percepção dos benefícios para os jovens aparecem em diferentes lugares e com particularidades interessantes. Após o trabalho no campo, os alunos contam um pouco sobre a experiência e sobre o que apreenderam nas vivências na fazenda São Luiz.
“A viagem agrícola fez muito bem pra mim, apesar do trabalho duro. Tudo o que fizemos de bom nós vamos receber de volta, a cachoeira levou embora todos os meus sentimentos ruins”.
Z – aluna
“Eu não imaginava que esse estágio seria tão marcante para mim. No começo, eu não estava tão animada, mas depois eu senti que vou levar essa experiência para sempre. Não apenas os conhecimentos mas também tudo que eu senti durante esse processo. Obrigada”.
M – aluna
“Bom, foi complicado viajar com a escola depois de dois anos de pandemia, mas a experiência foi incrível. Ver a realidade de pessoas que trabalham aqui na fazenda São Luiz e trabalhar com isso (por mais que a gente não tenha feito muito comparado com eles que trabalham aqui). Aprendi sobre agrofloresta, abelhas e gostei bastante disso. Não gostei de ir na Usina porque odeio o capitalismo e não tenho paciência pra esse tipo de gente, mas tem sacrifícios que temos que fazer, não é? Bom, pra finalizar queria agradecer a todos que tornaram isso possível (tem muita gente que eu nem consigo falar). Foi isso, obrigado”!
R – aluno