Topo

Comunidade Terra Prometida avança em ações na defesa e autonomia da mulher, educação das crianças e agricultura familiar agroecológica

Matéria publicada em 11 de dezembro de 2024.

O ano de 2024 foi um período de realizações importantes para o Centro de Integração e o Coletivo Mulheres em Ação na Serra da Misericórdia, que fazem parte da Terra Prometida, uma pequena comunidade do Complexo da Penha, na Zona Norte do Rio de Janeiro. Várias ações coordenadas, sobretudo na defesa e na autonomia das mulheres, e também na educação das crianças da região, têm prosperado e mostram que a comunidade está no caminho certo, apesar das dificuldades. A fundadora do Centro de Integração da Serra da Misericórdia e do Coletivo Mulheres em Ação na Serra da Misericórdia, Ana Santos, diz que questões como a soberania alimentar do território e o reflorestamento da Serra estão sempre em debate, devido à urgência de soluções.

Ana Santos – Fotos Raphael Pizzino

A agricultura familiar agroecológica, de acordo com ela, é o coração de todas as ações. “A gente sabe que o tema ambiental não é muito voltado para as pessoas da favela, da raça negra. Quando a gente fala de agroecologia, estamos tratando da retomada de hábitos cultivados pelos nossos avós e bisavós: plantar roçados nos seus quintais, cuidar das ervas medicinais. Então isso nasce dessa vontade de pensar o reflorestamento e a soberania alimentar, que a gente chama de soberania popular”, explica.

De acordo com o Boletim Saúde, Raça e Clima, produzido pelo CBJC (Centro Brasileiro de Justiça Climática), a crise climática provoca também uma crise na área da saúde, que afeta majoritariamente pessoas negras e indígenas. Segundo a pesquisa, doenças infecciosas como dengue, malária e hepatite são as mais sensíveis às mudanças no clima e são especialmente frequentes em territórios negligenciados no saneamento básico – de maioria negra e indígena.

E entram também nessa conta a assistência social, educação e cultura, temas que estão na ordem do dia, e que necessitam de ações coordenadas. “Uma Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Clima, por exemplo, precisa dialogar com todas as secretarias porque as enchentes estão aí, os desabamentos, que impactam o povo, e isso é uma questão ao mesmo tempo global e local”, diz Ana Santos.

Desafios

Como todas as questões dialogam entre si, não há como excluir dessa discussão a produção de alimentos, as energias renováveis. “Pra nós tudo é um desafio, porque estamos no meio da favela, num território “rururbano”, ou seja, rural e urbano, não mapeado pelo Prefeitura do Rio. É uma favela que cresce na mata. Então temos aquela dicotomia: como seguir preservando sem desconsiderar a necessidade de moradia das pessoas? É uma questão muito delicada”, pondera a líder comunitária. O território possui uma grande área verde de Mata Atlântica, que separa a Penha do Complexo do Alemão.

Para enfrentar esses desafios, a comunidade implementou o SAF, o Sistema Agroflorestal, que é uma forma de reflorestar pensando também na produção de alimentos. “A gente desenvolve os quintais produtivos urbanos, encontros de quintais, manutenção de árvores e plantios. Já plantamos batata doce, temperos, ervas medicinais, abacaxi, pitanga, jabuticaba, banana e acerola, além de outras árvores frutíferas da Mata Atlântica. E temos ainda a criação de animais, como galinha, pato, coelho e tilápia”, conta Ana Santos.

‘Menina dos Olhos’

Um projeto que, segundo ela, é a ‘menina dos olhos’ da comunidade é a Escola Popular de Agroecologia, um projeto que foi submetido à Saúva, em busca de apoio. A escola atende crianças de 4 a 14 anos no contraturno, com aulas diversas, como judô, leitura, agricultura e culinária. “A Escola é fundamental para a comunidade, porque apoia diretamente a mulher. A criança sai da escola e pode ir pra lá. É um apoio pedagógico, mas também afetivo, porque é uma troca, um intercâmbio. E esse é também o futuro para a Serra da Misericórdia, com essas crianças sendo atendidas todos os dias.”

Foto Raphael Pizzino

Outro programa importante é a Roda de Mulheres, que é o diálogo entre saúde e agroecologia, junto ao SUS. As mulheres participam dessa roda de conversa trazendo o tema da saúde coletiva, da ginecologia natural. “Nós desenvolvemos intercâmbios com a UERJ, grupos de extensão, e também a Produção Cidadã de Dados, onde a gente gera pesquisa e vai acompanhando”, acrescenta Ana Santos. Todas as atividades se interligam de alguma forma, sempre voltadas principalmente para as mulheres e para o público infantil. Os programas beneficiam diretamente cerca de 80 pessoas, e indiretamente, toda a comunidade.

Foto raphapizzino@gmail.com

Balanço positivo

O balanço das ações realizadas é muito positivo, diz a líder comunitária. “Foi um ano de estruturação de novas parcerias. Também foi um ano violento, com muitas operações policiais, e sofremos ainda com a questão das chuvas. Mas isso trouxe ensinamentos também, de como a gente consegue se organizar melhor para lidar com esses problemas, realizando, por exemplo, a coleta de água das chuvas”.

A sede própria, de acordo com ela, é um marco importante para todos. “Pela primeira vez que conseguimos construir a nossa sede, o que gera muita propriedade e segurança pra gente. Conseguimos implementar cercas de cimento nas casas, que oferecem uma defesa maior para as comunidades.”

Foto Raphael Pizzino

Para 2025, serão formados vários mutirões para que seja possível ampliar a produção agrícola. ‘Estamos com uma criação de pintinhos e a meta é produzir cerca de 40 ovos por dia. Desenvolvemos o Cozinha Solidária, uma parceria com o Ministério de Desenvolvimento Social. A cozinha gera muita autonomia pra gente, e renda também. Trabalhamos com uma alimentação bem diversificada” afirma.

Por Paulo Boa Nova.

Compartilhar: