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PAFE fomenta projetos para estimular saberes locais e a educação antirracista nas escolas

Matéria publicada em 25 de junho de 2024.

O PAFE (Programa de Apoio à Formação de Educadoras e Educadores), que nasceu em Paraty (RJ) em 2013, e depois se expandiu para Nova Lima (MG), em 2022, sofreu pequenos ajustes nos critérios de seleção dos projetos e continua a fomentar a formação de educadoras e educadores, com projetos individuais e coletivos.

O Programa apoia formações científicas, práticas e coletivas para quem atua na área da educação formal, não-formal ou informal. Em contrapartida ao apoio, cada participante deve realizar uma ação socioeducativa, além de integrar Mesas de Trocas mensais. Também há uma ação socioeducativa coletiva, com a participação de todo o grupo. Já foram mais de 170 formações apoiadas até o momento.

Há coletivos que se formaram e fortaleceram com o PAFE, como o Maria Angélica Ribeiro, em Paraty, formado por feministas. Outro trabalho importante é o Coletivo de Apoio à Educação Diferenciada do Fórum de Comunidades Tradicionais, que atua no apoio à educação em comunidades tradicionais de Paraty.

Coletivo de apoio à Educação Diferenciada em uma de suas atividades

A coordenadora do PAFE, Fabíola Guadix, conta que, há alguns anos, as escolas dessas localidades de Paraty só ofereciam educação até o nível Fundamental 1. Em 2016, a partir de uma grande mobilização feita pelas comunidades nos anos anteriores, o município iniciou a oferta do Fundamental 2 na Praia do Sono e no Pouso da Cajaíba, para que as crianças não precisassem sair de lá para estudar. “O objetivo desse coletivo de educadores era trazer os saberes do território, para que pudessem aprender e valorizar os saberes do seu local, resgatando assim a cultura caiçara, e as comunidades que estão ali ao menos desde o bisavô, e que mantêm algumas tradições, na pesca, na forma de pescar, no fazer da canoa, no plantio e na alimentação”, explica (ver mapa abaixo, sobre a ampliação do ensino nas escolas).

Fórum de Comunidades Tradicionais (FCT) e Coletivo de apoio à Educação Diferenciada viabilizaram a ampliação do ensino público em várias comunidades

O Coletivo de Apoio à Educação Diferenciada do Fórum de Comunidades Tradicionais atua desde 2014 na cidade de Paraty reunindo educadores, lideranças comunitárias, universidades, e parceiros em geral com a finalidade de fortalecer a educação das comunidades tradicionais do município.

Desde 2016, o IEAR/UFF promove formações para educadores das escolas caiçaras, em cooperação com a Secretaria Municipal de Educação, com o Programa Escolas do Território (que conta ainda com participação do OTSS e Colégio Pedro II). A Saúva, através do PAFE, apoia a realização dos projetos pedagógicos das escolas desde o início, com recursos para a realização de oficinas, seminários e elaboração de material pedagógico, que contribuem na formação dos educadores e estudantes, mediada por mestres e mestras locais.

De acordo com Guadix, a ideia do coletivo é não ter aquele currículo igual pra todo mundo, em toda escola, em qualquer lugar. “O objetivo é ter um currículo que traga a valorização dos saberes locais, e melhor ainda se isso acontecer com a participação dos mestres da cultura caiçara”, complementa.

Organizado há 10 anos, o Coletivo atua com a mobilização das comunidades e a articulação política e institucional para incidir nas políticas públicas da educação das comunidades tradicionais. Com o recurso do PAFE, eles puderam remunerar mestres para realizarem oficinas e palestras nas atividades escolares, o que é uma formação tanto para os educadores, que em sua maioria são de fora da comunidade, quanto para os alunos, que veem os saberes tradicionais valorizados como conteúdo escolar. Ao final dos projetos, foram realizados seminários abertos para a apresentação dos resultados do trabalho.

Além do trabalho desenvolvido com o Coletivo de Apoio à Educação Diferenciada, outros projetos apoiados pelo PAFE são a Escola Waldorf Quintal Mágico, que desenvolve um trabalho de educação antirracista por meio de um letramento racial, e o “Kindezi”, um programa de afroeducação desenvolvido por mulheres negras em Paraty, que se juntaram e abriram para atender crianças.

“A gente está apoiando a formação dessas mulheres negras, que fazem um curso com uma mulher, que é de Paraty, uma formadora neste assunto. Estão estudando autoras negras. São cerca de seis encontros, bem conceituais. Essa formação já está em curso”, conta a coordenadora Fabíola Guadix.

Ela explica que o tema da educação antirracista adquire ainda mais importância por se aplicar a uma escola Waldorf. “Essas instituições têm um currículo bem europeu. Porque a pedagogia Waldorf nasceu lá, então eles seguem uma linha bem eurocêntrica. O Quintal Mágico já nasceu com um projeto de inclusão. Participei no 1º ano, depois fui professora, fui mãe”.

Fabíola conta que a Escola tinha uma política de bolsas muito extensa e inclusiva, e isso permitiu que realmente houvesse uma diversidade na escola. “A maior percepção e admissão do racismo tem mostrado esses acontecimentos em muitas escolas e na sociedade de um modo geral. Em 2023 houve caso de racismo dentro da sala de aula, que despertou a necessidade de uma ação de letramento racial. Quando isso acontece e você não tem um letramento, uma política, as pessoas não sabem como lidar. Nem o pedagógico, nem a comunidade”, observa Fabíola Guadix.

Por isso, a coordenadora destaca a importância de se trazer essa formação, não só para o pedagógico, mas um projeto aberto, voltado para o administrativo, e que inclua também as mães e os pais dos alunos. “É preciso trazer isso para a escola como um todo, para que isso seja um valor afirmativo da instituição. E não é só trazer as famílias para dentro da escola, mas realmente aplicar o que já é lei. É preciso haver um currículo diferente. Ter famílias, ter professores e professoras negros dentro da escola, o que é muito importante para as crianças, como referência. É um combo de ações que uma escola tem que adotar para que seja uma instituição que inclui, uma escola antirracista”.

A coordenadora ressalta que, na educação, é importante entender que a inclusão é muito mais do que uma política de bolsas. Ela tem que ser mais verdadeira do que isso, no currículo, na equipe, nas contratações. Trata-se de uma escolha. “Eu fiquei feliz de podermos estar apoiando esse projeto no Quintal Mágico, porque pessoalmente tenho muito carinho por eles, já dei aula lá, meu filho já estudou lá, vi a escola nascer. Muito legal ver o PAFE dando esse apoio, e que venham outros, porque não é uma coisa que um curso vai resolver, é preciso uma política continuada, e permanente. Trazer para a consciência, para que possam construir isso de forma verdadeira”, conclui.

25 de Junho de 2024.

A redação desta matéria contou com a colaboração do jornalista Paulo Boa Nova.

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