Matéria publicada em 4 de junho de 2024.
A Escola Waldorf Quintal Mágico está buscando se aprofundar na temática da educação antirracista, a partir de um diagnóstico de necessidades da escola, e convidou Daniele Caetano para ministrar um curso para a equipe da escola. Daniele é Mestre em Educação, tem especialização em Fundamentação em pedagogia Waldorf, Educação Inclusiva e História, Cultura Indígena e Afro-brasileira. Daniele Caetano desenvolveu uma tese de mestrado em que ela entrevista as professoras Waldorf sobre a questão da educação étnico-racial. A aproximação já vinha acontecendo há um tempo, sendo concretizada com o fomento recebido da Saúva e PAFE em 2024. O trabalho com a equipe docente da escola vem ao encontro a uma percepção de que o tema do combate ao racismo deve sair de um lugar moralista e ser entendido como um problema estrutural do país. Para isso, a escola visa desenvolver políticas de enfrentamento e ações afirmativas que contribuam com uma educação antirracista.

A professora Mariana Harue e a coordenadora administrativa Luciana Penafortes nos contam mais detalhes sobre o curso, sua importância para a escola e seus desdobramentos. A primeira fase do curso presencial foi de sensibilização com a equipe de professoras e depois uma conversa aberta às famílias da comunidade escolar. No dia seguinte, o trabalho foi direcionado aos funcionários e professores da escola, onde a temática do racismo e antirracismo foi abordada por um viés estrutural e político ao longo do tempo. “Ela fez um caminho histórico explicando como isso aconteceu politicamente, as leis que fortaleceram o racismo e chegando ao racismo institucional”, conta a professora.
“A partir de uma política colonialista, o racismo se institucionalizou estruturalmente. Precisamos entender que essas políticas foram desenvolvidas para marginalizar esse povo e como conseguiremos enfrentar esse problema do nosso país enquanto instituição antirracista. Essa é a nossa grande inquietação, dúvida e impulso, pois não basta não sermos racistas, devemos ser antirracistas”.
Mariana Harue – Escola Waldorf Quintal Mágico
Comentaram também sobre as dificuldades de instituir vagas afirmativas, de como isso deve acontecer de maneira saudável para o contexto escolar, dos empecilhos na deficiência de formação em geral e especificamente na pedagogia Waldorf. Essa reflexão chegou às professoras e às questões de autodeclaração racial e autoidentificação étnica, que ainda geram dificuldades de entendimento, porque podem ter significados diferentes dependendo de onde a pessoa está falando. “Enquanto pedagogia Waldorf que veio da Europa, não é para não termos a perspectiva europeia e seus estudos, mas ampliarmos e diversificarmos imagens, símbolos e trajetórias a partir da nossa diversidade racial”, explica Mariana.
Ela continua falando sobre a riqueza da cidade de Paraty em termos de diversidade étnica, por ser uma cidade portuária, da escravidão, povos indígenas originários (Caiçaras) e muitos estrangeiros presentes em sua formação. Tudo isso trouxe uma riqueza étnica, social e de linguagens muito grande para uma cidade do tamanho de Paraty e muitos desafios também, segundo Mariana.
A visão histórica sobre o racismo no país levou a outras reflexões sobre posicionamentos antirracistas na prática, como o olhar que parte de uma visão macro, mas também do olhar individual, de onde estamos e qual o papel de cada um nessa luta. Após essa primeira parte de sensibilização, financiada pela Saúva, a equipe da Quintal Mágico iniciou um trabalho de letramento racial, financiado pelo PAFE, que ocorre quinzenalmente, e estão trabalhando o racismo estrutural que fundou o país, do racismo institucional que não está desconectado do contexto brasileiro e quais são os mecanismos de enfrentamento.

Luciana Penafortes, responsável pelo RH e administração da Quintal Mágico, acrescenta que durante a sensibilização elas participaram de dinâmicas que serviram para mostrar as diferenças históricas, na infância e oportunidades que aprofundam o preconceito e as desigualdades sociais no país. Nesse momento, considerou importante a postura mais firme e impactante da Daniele Caetano, que provocou a equipe no sentido de saírem da zona de conforto, pararem para pensar que o racismo é um problema real e no que pode ser feito para mudar essa situação.

“Gostaria muito de continuar esse trabalho para podermos traçar planos e mostrar caminhos de mudanças institucionais para serem incluídos nos planos pedagógicos da escola, com estudo e embasamento”, conclui Luciana.
O curso foi o início de um processo que deve se estender na escola em propostas e ações cotidianas antirracistas. Essa estruturação das ações, com mais fundamento, já trouxe mais comprometimento da equipe, que tem se aprofundado na literatura específica, referências pedagógicas e metodológicas mais abrangentes.